A vida digital tem transformado profundamente o comportamento de crianças, jovens e adultos. O livro “A geração ansiosa: como a infância hiperconectada está causando uma epidemia de transtornos mentais”, de Jonathan Haidt, apresenta informações valiosas sobre como as mudanças tecnológicas, especialmente a partir de 1995, trouxeram consequências importantes para o desenvolvimento social e emocional dessa nova geração, trazendo reflexões fundamentais sobre como podemos atuar nos dias de hoje para proteger nossas crianças e jovens, desenvolvendo os cidadãos digitais.
A Geração Z: nascida após 1995
Com a convergência de tecnologias como a internet de alta velocidade, o lançamento do iPhone em 2007 e a popularização das mídias sociais, as crianças e jovens de hoje estão crescendo em um contexto único. A chegada do smartphone com câmera frontal, e recursos como "curtidas" e "compartilhamentos", alterou radicalmente a forma como se relacionam e compartilham suas vidas.
Pela primeira vez, essa geração viveu a adolescência com um "portal" sempre acessível em seus bolsos, oferecendo um universo excitante, viciante e, muitas vezes, instável. O mundo virtual, com suas recompensas instantâneas, parece cada vez mais atraente, mas também é um ambiente inadequado para o desenvolvimento emocional de crianças e jovens.
Cada vez menos tempo no mundo real
Com mais tempo passado no mundo digital, nossas crianças e jovens estão perdendo oportunidades valiosas de brincar, conversar e estabelecer conexões presenciais com amigos e familiares. Essas interações face a face são essenciais para o desenvolvimento de habilidades sociais e emocionais, fundamentais para a vida adulta.
A chamada "economia da atenção", onde as plataformas disputam cada segundo de engajamento, contribui para essa dinâmica. A consequência é um impacto direto nas competências sociais que as crianças precisam desenvolver para uma vida equilibrada.
Convergência de duas grandes tendências: tecnologia e superproteção
Além do avanço tecnológico, vivemos em uma época de superproteção das crianças no mundo real, o que contrasta com a falta de proteção no mundo virtual. Há uma falsa sensação de segurança quando as crianças estão em casa, mas, muitas vezes, elas estão navegando em espaços adultos, consumindo conteúdos inapropriados e interagindo com pessoas mais velhas.
Embora a intenção seja proteger, a superproteção tem um custo. Em nome da segurança, muitas crianças passam mais tempo dentro de casa e online, o que limita suas interações face a face, a linguagem corporal e o contato olho a olho. Essas experiências, fundamentais para o desenvolvimento emocional, acabam sendo perdidas no ambiente digital.
Impactos do uso constante do uso do celular: queimar a largada da vida adulta
O uso constante do celular na infância e adolescência tem gerado uma série de impactos negativos, entre eles:
- Privação de sono;
- Privação social;
- Fragmentação da atenção, com impactos diretos na aprendizagem;
- Vício em dispositivos e redes sociais;
- Efeitos nocivos das mídias sociais, especialmente para meninas, que enfrentam maior pressão quanto à imagem corporal e aceitação social. Meninos, por outro lado, são impactados de maneiras diferentes, como o desenvolvimento de dependências digitais ou a falta de habilidades sociais para enfrentar a vida adulta.
Com a pouca regulação no ambiente digital e a superproteção no mundo real, muitas crianças estão crescendo sem as ferramentas necessárias para lidar com os desafios da vida adulta. A falta de autonomia e a exposição controlada ao mundo exterior cria indivíduos mais frágeis, que entram na vida adulta sem a resiliência necessária.
Fundamentos para uma infância saudável
Alguns princípios podem ajudar a resgatar uma infância mais equilibrada e saudável:
- Sem smartphones antes do Ensino Médio;
- Sem redes sociais antes dos 16 anos;
- Escolas livres de celulares;
- Mais tempo para brincadeiras não supervisionadas e infância independente.
A era digital trouxe inovações que transformaram a vida das crianças e jovens de maneira significativa. Contudo, também gerou desafios que precisam ser enfrentados tanto por pais quanto por educadores. Repensar o papel da tecnologia na infância e incentivar o equilíbrio entre o mundo real e o virtual é essencial para garantir o desenvolvimento saudável das futuras gerações.
*Texto elaborado a partir das reflexões realizadas pela diretora-geral do Colégio Rio Branco, Esther Carvalho, e as famílias durante os Encontros com a Direção de maio e junho de 2024.