Magreza não é sinônimo de saúde, explicam especialistas

Juliana Góis, Orientadora Educacional do Colégio Rio Branco, e Veridiana Monteiro, médica pediatra, refletem sobre os padrões midiáticos e a busca incessante pela magreza

Nas redes sociais, as pessoas navegam diariamente pelas vidas de amigos, familiares, colegas, celebridades e desconhecidos — ou melhor, pelo que cada um decide compartilhar. A questão é que essas imagens são recortes, muitas vezes editados e, até mesmo, fictícios, da realidade. Com o frequente contato com identidades virtuais alheias, os indivíduos se veem presos a padrões de corpo, rosto e estilo de vida idealizados. 

Como resultado, cada vez mais usuários buscam meios para se encaixar no padrão, tanto pela edição online quanto mudanças offline. “Os desdobramentos secundários ao uso de filtros — que, dentre inúmeras possibilidades, afinam o nariz, levantam a sobrancelha, tornam os lábios mais cheios e capricham na simetria, bem como dão uma maior exposição à imagem — bateram na porta dos consultórios de cirurgia plástica. Em um estudo da Academia Americana de Cirurgiões Plásticos, verificou-se que a motivação de 55% das pessoas que fizeram rinoplastias, em 2017, foi o desejo de sair melhor em selfies”, diz Juliana Góis, Orientadora Educacional do Colégio Rio Branco. 

No Brasil, os índices são alarmantes: segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, o país lidera o ranking de cirurgia plástica entre jovens. Quando os consultórios médicos e os filtros não são suficientes, é comum que as pessoas recorram a dietas e jejuns, visando alcançar um corpo magro, saudável e, de acordo com padrões de beleza preestabelecidos em grande parte pela mídia, atraente. Mas existe um verdadeiro perigo nessa questão: magreza e saúde não necessariamente andam juntas.

Por que magreza não é sinônimo de ser saudável?

“Tudo é uma questão de estilo de vida, hábitos adquiridos e pensamentos cultivados. Um corpo magro pode encobrir problemas de saúde como dislipidemias (colesterol elevado), hipertensão arterial, diabetes, câncer, anorexia nervosa, desnutrição, entre outros. Tudo depende da composição corporal desse indivíduo”, afirma a Dra. Veridiana Monteiro, responsável pelo departamento médico do Colégio Rio Branco, na Unidade Higienópolis.

De acordo com as duas profissionais entrevistadas, outros fatores, além do peso, devem ser levados em consideração ao analisar a saúde, como a genética e as atividades cotidianas. “Se uma pessoa fuma, consome álcool em excesso, possui uma alimentação desbalanceada rica em embutidos e industrializados, ela está, apesar de magra, somando fatores de risco para o desenvolvimento de doenças”, diz Juliana Góis. 

A busca pela magreza

A mídia idealiza, por meio das revistas impressas, televisão ou redes sociais, um corpo magro como esteticamente mais atraente. Segundo a médica, não há problema que um corpo se construa magro com hábitos saudáveis, conscientes e respeitosos, mas é muito importante não cruzar o limite individual. 

“Se para obter a magreza for preciso recorrer a práticas exageradas, como dietas malucas da moda, exercícios extenuantes, purgação, medicamentos autoprescritos, cirurgias mutiladoras, de nada vale apenas a beleza externa. É uma questão de tempo para tudo desandar”, coloca. 

Pessoas acima do peso podem estar saudáveis? 

“Condenar alguém com o corpo acima do peso ‘ideal’ é um erro. Se essa pessoa cultiva hábitos saudáveis, como boa alimentação, exercícios físicos regulares, ausência de vícios como o tabagismo e o etilismo, e sem doenças associadas ao excesso de peso, como problemas osteomusculares, a única coisa que lhe falta é o corpo esteticamente perfeito idealizado pela mídia”, afirma a Dra. Veridiana Monteiro. 

Nesse contexto, a médica ressalta que, para ser considerada saudável, há um desafio para as pessoas acima do peso: não se abalar por olhares e falas discriminatórias. Isso porque a saúde inclui, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), o bem-estar emocional, social, espiritual e físico — o qual não depende da forma do corpo, mas, sim, da sua composição.

Como trabalhar a questão do peso com a nova geração?

Para tornar saudável a relação das crianças e adolescentes com os próprios corpos e as suas imagens virtuais, de acordo com Juliana, é essencial não tratar a questão do peso como tabu. A Orientadora Educacional aponta algumas dicas para os educadores (pais ou profissionais) trabalharem o assunto:

  • colocar o foco na saúde e no bem-estar;
  • abordar a beleza, a diversidade e a aparência de cada um de forma positiva;
  • agir como exemplo para os mais novos;
  • incentivar hábitos que façam com que o indivíduo se sinta bem consigo e com seu corpo;
  • conversar sobre as diferenças estéticas;
  • estimular a prática de atividades físicas;
  • discutir sobre os impactos das escolhas alimentares e dos estilos de vida no cotidiano;
  • compreender o que é real e o que é falso nas redes sociais;
  • respeitar os limites e necessidades do próprio corpo.

Além disso, é fundamental conversar sobre o uso de filtros e aplicativos de edição que, preferivelmente, devem ser usados de forma lúdica, sem focar nos padrões de beleza e na distorção corporal. “A linha entre a brincadeira e a preocupação estética exacerbada é tênue e é nosso dever, enquanto usuários dessas ferramentas, pais e educadores, ficarmos muito atentos, principalmente com as gerações mais novas”, aponta Juliana Góis.

“Trabalhando esse conceito com os jovens, os educadores podem ajudar a mudar os valores distorcidos nas gerações atuais a respeito de magreza (= saúde/sucesso) e obesidade (= doença/fracasso), tão facilmente difundido pelas redes sociais e mídia em geral. Além disso, podem colocar um fim na busca por um modelo de beleza e felicidade inatingível que só existe por meio de filtros, mas não no mundo real”, finaliza a Dra. Veridiana.

 

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