Ponto de Vista

Pela cidadania política de nossos alunos

Por Esther Carvalho (texto publicado no Perfil Econômico | 15 de maio de 2015)

Escola é lugar de muitos desafios, mas, sem dúvidas, é um espaço inspirador e de otimismo. É um lugar em que há gente formando gente. Complexo e fascinante ao mesmo tempo, traz problemas e traz presentes. Para a alma.

Como diretora de escola, recebi, recentemente, um desses presentes: fui solicitada a participar de uma reunião com um grupo de alunos do 2º ano do Ensino Médio que queriam me apresentar um projeto. Já, na véspera da reunião, recebi, por email, a pauta do encontro e o material para leitura prévia do que seria discutido. Antes da reunião, já me senti muito motivada: em primeiro lugar porque proposições de ideias, projetos, sugestões são muito bem vindos em nossa escola, pois trabalhamos para que nossas crianças e jovens sejam preparados e incentivados para serem protagonistas de seu tempo. Em segundo lugar, pelo fato de o material enviado destacar-se pela qualidade e consistência, igualando-se, ou até mesmo, superando outros projetos propostos por adultos. Mas o melhor estaria por vir.

Nossos jovens no Colégio Rio Branco têm oportunidade, a partir do 9º ano do Ensino Fundamental até o Ensino Médio, de participar e de organizar simulações da ONU, representando, na solução de conflitos, delegados de diferentes países em seus contextos culturais, econômicos, políticos e sociais. É uma forma muito rica de se compreender melhor o contexto global e de se desenvolver a tolerância. No caso da reunião solicitada, jovens, que já tinham experimentado as simulações da ONU e de outros modelos, trouxeram a ideia de realizar uma simulação em que poderiam se aprofundar nas discussões políticas de nosso país. A argumentação que fundamentou o projeto era de que eles queriam criar oportunidades de desenvolver a cidadania política na escola. Fascinante!

Diferentemente dos alunos representarem países, como nas simulações da ONU, no modelo de simulação do Congresso, os alunos assumem papéis de representantes políticos e debatem possíveis soluções para problemas que se apresentam. No caso do projeto proposto, seriam representados o Senado, a Câmara dos Deputados, o Supremo Tribunal Federal, a Casa Civil, entre outros. Alguns dos temas a serem tratados seriam: aposentadoria, educação, questões do chamado petrolão e do mensalão. Pressupondo a realização de pesquisa e de muito estudo, os estudantes indicaram o nome de professores que poderiam orientá-los. O projeto apresentado foi aprovado e está em andamento.

A escola não é um espaço de política partidária, mas, sim, um espaço de formação política em que as crianças e jovens têm oportunidade de refletir sobre sua realidade local e global, convivendo com diferentes pontos de vista, procurando desenvolver a empatia, colocando-se no lugar do outro e buscando soluções para os problemas cotidianos. Mário Sérgio Cortella, filósofo e escritor, professor da PUC de São Paulo, afirma que não existe neutralidade política, mas pode haver objetividade. Para ele, neutralidade pressupõe ignorar que diferenças existem. Objetividade, por outro lado, implica no fato de se estabelecer diálogos e interlocuções que levam em conta que existem diferentes pontos de vista que devem ser respeitados. Independentemente de suas opções pessoais, o professor, em sala de aula, deve ser objetivo para, sem ser neutro, criar oportunidades de politização de crianças e jovens.

A iniciativa dos alunos , que conta com o apoio de ex-alunos, será realizada na escola e é um exemplo de protagonismo. Esses jovens, filhos da democracia, num difícil momento de credibilidade política pelo qual passa o Brasil, trazem a necessidade de se compreender melhor esse contexto e querem estudar o assunto. Isso traz otimismo. Otimismo pelo trabalho que vem sendo realizado na escola e que abre espaço para que os alunos proponham projetos para serem por eles desenvolvidos, com o apoio dos educadores; otimismo pelo fato de que estamos formando pessoas diferentes, mais conscientes e melhores do que nós e que podem construir uma sociedade mais justa.

 

Ponto de Vista
Esther Carvalho
Diretora-Geral do Colégio Rio Branco